Dragões sem cabeça
Giovani Pasini (professor e escritor)
E-mail: professorpasini@gmail.com
Na obra Ovelhas Negras, de Caio Fernando
Abreu, existe um pensamento do I Ching
que julgo bastante interessante. Em nossa vida “(...) aparece uma revoada de
dragões sem cabeça”. Tal afirmação leva a uma reflexão básica: a maioria de
nossos problemas não está do lado de fora, mas dentro de nosso cérebro. São os
imaginários “dragões sem cabeça” que atormentam bem mais, do que realmente fazem
mal.
Na interação entre as pessoas existem,
pelo menos, três mundos paralelos: o que imaginamos, o que o outro imagina e o que
poderia ser o real. Só que o mundo real também não existe de forma pura,
verdadeiramente.
Equívocos. Distrações. Distorções.
Algumas vezes, na falha de comunicação,
atuamos de forma errada. Erros, erros e mais erros. Não é por mal, mas
acontece. Aos que falam de menos, a ofensa realizada parece maior, em virtude
do que não foi dito e poderia ter sido. Os que dizem para mais, as palavras que
voam da boca percorrem o espaço feito adagas cortantes. Magoamos e somos
magoados.
Temos olhares e gestos convencionados;
apresentamos cumprimentos e respostas definidas. O sorriso, a testa enrugada, o
abanar de mãos, o gesticular de cabeça. O determinismo de meio (local em que se
vive) e de momento (tempo histórico) definem parte do caráter do indivíduo. A
coletividade (real e virtual) influencia nas escolhas que fazemos, por intermédio
da internet, da televisão, do cinema, da música, da leitura, dos amigos e tanto
mais.
Certa época de minha vida – há pouco tempo
– pensei em desistir de nós, seres humanos. Numa introspecção profunda,
agarrado aos livros, preferia o silêncio do que as conversas difusas, coletivas.
As letras escritas me pareciam mais fáceis do que as palavras faladas. Penso
que vários leitores também já tenham se sentido assim. Mais adiante, contudo,
percebi que os diálogos eram essenciais para a constituição da própria
humanidade. O problema poderia não estar nos outros.
Quero dizer, ainda continuo agarrado nos
livros; apenas questão de opção.
Mas, constantemente, busco tirar os “grilos”
da minha imaginação. Vou onde quero ir; penso no que desejo ponderar; agrado a
quem julgo essencial. Isso estabilizou a minha calma e afastou diversos dragões
indesejados; principalmente aqueles “sem cabeça”.
Querido amigo, Giovani! Você me levou, com seu texto, a um passeio pela literatura, pela filosofia, psicologia e pela milenar cultura chinesa que tanto aprecio! Enquanto lia, sentia você falando e para mim! Acredito que outros leitores também tiveram essa rica experiência. Parabéns, parabéns.
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